segunda-feira, outubro 29, 2007

Precisa-se de cúmplices para devaneios oníricos
Un jour, il fait la connaissance de Stéphanie, sa voisine, dont il tombe amoureux.

quinta-feira, outubro 25, 2007

Deixava o Fórum não sem pressa, em mais uma sexta-feira de promessas infundadas. Livre! Corri para alcançar o carro estacionado a duas quadras. Muito barulho, muitos carros, muitos carros e o céu que ameaçava chuva iminente. Andava com pressa e à minha esquerda uma escola. Uma banda de fanfarra claudicava uma marchinha conhecida. Sinal verde, muitos carros, o carrilhão insistia longe. À minha esquerda, uma escola, um casal conversava, um relâmpago, o sinal vermelho. Vi uma garotinha junto ao casal. Ela me acompanhava com os olhos de interesse longínquo. A fanfarra havia cessado; com interesse também acompanhava sua curiosidade viva, natural. Segui caminho observado enquanto observava atento quase em transe. Sinal verde, sinal vermelho, deveria atravessar, acenei para ela. Ela acenou como se importasse e, já distante, sorri com toda minha infância.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Noite de sábado, uma hora da manhã, sentado a uma mesa com amigos em volta. Tudo ia muito bem na balada ordinária, quando fui acometido por um terrível e implacável lapso de lucidez. E, de repente, já não conseguia mais falar, já não ouvia meus amigos e mesmo a cerveja era intragável. Os olhos quiseram-se abertos, entre o susto e o novo que não anunciam aproximação. De repente, aquela gente toda havia se tornado uma grande massa opaca e sem graça. Ponderei sobre o cabimento de estar ali, a participar daquele quadro burlesco e enfadonho. Por um momento, repudiei, repudiei toda aquela fumaça lançada boca afora a lembrar sinistro ritual suicida de longo prazo. Repudiei aquele cheiro de álcool que exalava de corpos animados aos auspícios da flacidez cerebral. Então é assim, ficamos a semana inteira a esperar, ansiosos pela sexta-feira que precede, ora vejam, a nada! Foi quando me lembrei de Nietzche e de Schopenhauer: saí correndo ao banheiro, molhei bem o rosto e fui dançar ao som de um rockzinho sem-vergonha.


Dia seguinte, recaída. Fui assistir ao Tropa de Elite. “Cão quando não vem, manda cem!”, já se fala em minha terra. Não era pra agora, mas, enfim. Assisti.
Finalmente! Finalmente, podemos conhecer outra versão dos fatos. Finalmente algo é mostrado além daquele velho discurso monódico e preguiçoso, para o que policial e bandido se digladiam dia e noite num país distante e fictício, mostrado à curiosidade mórbida e transigente da maioria. Já não nutria simpatias por maconheiro e seus derivados, e, assistindo ao filme, que Deus me perdoe, tive ímpetos de virar o incorruptível Capitão Nascimento e distribuir afabilidades a essa pobre gente incompreendida e carente que, no final das contas, é pena, não consegue encontrar nada melhor pra fazer. Catarse. Tomara possamos exportar heróis policiais, à maneira dos norte-americanos, quem sabe. Enlatados, hã. Por que não? Se bem que os gringos podem achar tudo isso muito miserável.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Escrito em um comprovante de compra de água mineral 1500 ml, Rua do Catete, 245, RJ
O desejo de escrever é insuperável e percebo que, quanto mais distante esteja, mais a memória transborda, o que me faz supor o ato de escrever uma tentativa de se evitar a desmemória. De outro modo, me pergunto, como ser fiel à memória que, longe de mero repositório de imagens, mostra-se fluidia, quase vaporosa? Talvez a memória não exija fidelidade e mesmo só exista porque reconstruída a cada evocação, que está no agora.

quarta-feira, outubro 17, 2007

Caso do chapéu
Havia 10 anos, Carlos era professor em uma escola localizada no bairro onde morava. Em ocasião de viagem, Carlos comprou um chapéu panamá com o qual, súbito, resolveu dar suas aulas. Estranharam. Colegas, os mais complacentes, insinuaram extravagância. Outros quiseram fosse algum desajuste patológico. Ao diretor, um insulto. Os alunos não acharam nada.

domingo, outubro 14, 2007

Prolixo
Desde a 5ª vez que te vi, gostei de você. Ainda distante, como sempre distante, mas quem sabia, de algum modo, a observar. Vi teus olhos, estranhei, os vi negros, embora tão clara. Depois as músicas, te vi dançar, sorrir, dançar sorrindo e novamente distante, cansada, a uma mesa. Te vi beber, sorrir, ainda distante, e brinquei com teu nome, nada de mais. Te vi cuidar e, de ter cuidados, exceder, sorrir e o mundo parar. Comer cachorro quente e comentar, à música predileta, sobre o dia prestes a surgir. Desde a 5ª vez, ainda distante e agora a ordenar, vire à esquerda seu tonto! Aprendi o teu nome, memorizei os teus olhos, gravei a tua voz clara como a ensaiar o dia. Vamos ao cinema?

terça-feira, outubro 09, 2007

De ordinário
Virtude apreciável em uma pessoa é a gratidão. Sempre tentei ensaiar tal qualidade, de forma precária é bem verdade, presenteando alguém, cuja atitude tenha me beneficiado ou agradado, com um livro ou um cd. Mas na busca desse invejável predicado, acabo por esbarrar num problema insondável que resulta no confisco do presente. É, acabo por gostar do livro e fico com ele. Sem maiores remorsos. E, assim, conheci Gonçalo M. Tavares e seu O Senhor Calvino, editado por esses dias ô pá, pela Casa da Palavra. Quem vê a capa não dá nada. Livrinho fininho de contos que não pára em pé. Mas, vá lá. É, assim, singelo na aparência que surpreende o desavisado desde o início: “Do alto de mais de trinta andares, alguém atira da janela abaixo os sapatos de Calvino e a sua gravata. Calvino não tem tempo para pensar, está atrasado, atira-se também da janela, como que em perseguição.”
Dei uma olhada em outros volumes de seus contos que fazem parte do projeto O Bairro e, tanto em O Senhor Brecht como em O Senhor Kraus, fui absorvido de logo pela atmosfera lúdica, fantástica mesmo, que sublima dos textos à maneira de poesia, a nos insinuar algo que, por si só, o texto não comporta. Mas, não são poemas não. Nem prosa poética. Corta essa.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Tiens! Todos me recomendaram, “vai lá, assista, você vai adorar...”, e fui, livre de maior cautela e prevenções, fui ao cinecultura assistir ao Paris, Je t’aime. As 18 histórias não contavam, como supunha, as relações de personagens franceses ou estrangeiros com a cidade, mas dramas humanos que, de ordinário, dispensariam qualquer referência espacial. Ah, mas Paris... Tudo bem! Poderia falar dos senões, dos vampiros filme B em “Quartier de la Madelleine”, do empertigado vendedor de cosmético capilar em “Porte de Choisy” - um tanto hermético -, ou da precária tentativa dos idealizadores em estabelecer relação entre os curtas... mas como ignorar a estranha sensação de leveza e mesmo, por que não?, de entusiasmo que se nos assalta ao fim da sessão, oh, onde você estava? Francine, Francine...Francine e seu Thomas flash back a la Corra, Lola, Corra. É, temos medo de atrizes! Ademais, os estrangeiros. Na sua maioria, estrangeiros em terra estranha – não os encare que é perigoso. Aí sim, poucas cidades servem tão bem à condição alienígena que a Paris arredia e ensimesmada, cada vez mais fechada em sua filosofia ranzinza. É medo. Que melhor lugar para se sentir estrangeiro! Que melhor lugar Carol? Carol tão americana com sua pochette cingida às adiposidades abdominais, tão só, tão lúcida. Carol que, finalmente, nos fala, com seu francês sumário, desse amor inexplicável que a cidade inspira. Recomendo.
Com certeza!

Somos prisioneiros dos nossos sonhos. Vivemos, assim, o paradoxo segundo o que somos cativos de nossas próprias utopias. Ou, em outras palavras, não experimentamos a liberdade sem transcender. Se bem que essa aparente controvérsia (como toda controvérsia, aparente) cai por terra ao notarmos a fonte dos sonhos, a mente humana que de tão humana suspeita, sempre, algo além, algo fora, na inquietude do insatisfeito, do sonhador. O sonhador é um insatisfeito, pois, que se rebela contra a realidade imperfeita. Daí a única certeza, a realidade é precária e carece de reparos os quais não se conseguem senão no instante de uma idéia. A realidade não é auto-explicativa, a realidade é uma versão. É dessa versão que estamos irremediavelmente cativos. Entenda-se, no entanto, que tal versão das coisas é ato criativo que, por sua vez, é expressão da liberdade.
A certeza é a ignorância do futuro e o esquecimento do passado. É o grito do tolo, o silêncio do sábio. A certeza é a maior das ficções.

sábado, outubro 06, 2007

Misericórdia
Todos os golpes foram na cabeça. E como não respirava mais, atirei na cabeça. É preciso misericórdia.